viajando sozinha

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Mulheres que viajam com os lobos

Reflexões sobre o retorno ao Self viajando sozinha

Um dos meus livros favoritos, Mulheres que Correm com os Lobos, traz a história da Mulher-Foca. Trata-se de um ser místico: focas que viram mulheres quando retiram a pele. E uma personagem em específico, a Tanqigcaq, passa por uma situação recorrente (do ponto de vista simbólico) no universo feminino…

Em mais uma noite, Tanqigcac (que significa “a brilhante sagrada”) ria e dançava com outras mulheres desnudas de suas peles de focas. O que aconteceu foi que um homem, encantado pela beleza e vivacidade do grupo, escondeu uma das peles – por acaso, a que pertencia a Tanqigcac.  E prometeu devolvê-la após sete verões sob duas condições: de que ela se casasse com ele; de que ela pudesse escolher entre ficar ou ir embora depois desse período.

Reticente, ela acaba aceitando. E sua vida segue “feliz” até que sua pele de mulher começa a perder a cor e ressecar. No limite do prazo, Tanqigcac estava irreconhecível, seca e sem vida. Ela exige a pele de volta e, quando a consegue, ao entrar no mar, toda a sua vivacidade, cor e energia retornam ao corpo.

Pele da foca

Com esse conto a autora traz a reflexão não só sobre o que nos rouba a alma (representada pela pele da foca), mas também sobre a nossa necessidade de retornos esporádicos ao lar selvagem (como ela se refere ao self). A um lugar de conexão profundo com si mesmo, um espaço para reconstituição do próprio ser.

Para mim, viajar sozinha é como vestir minha pele de foca e saltar em um mar desconhecido. É uma oportunidade de mergulho no mundo e em mim mesma. Me identifico com o conto porque o cotidiano – que ora me encanta – começa a roubar meu brilho com o passar do tempo e o trabalho se torna automático e fatigante. Nessa hora, percebo que preciso de uma pausa para estar alhures de corpo e alma. Desconectar das tarefas, reuniões, relatórios e me deixar distrair com detalhes de paisagens exóticas ao meu olhar ou sabores inéditos ao meu paladar.

Resolvi falar um pouco sobre isso hoje por vários motivos.

Voltei recentemente de uma slow trip de 20 dias, viajando sozinha no deserto do Atacama, e a poesia das areias, vulcões e estrelas ainda me inspiram, e também porque é mês das mulheres e precisamos falar sobre como muitas de nós ainda têm medo de sofrerem preconceito ou violência estando sozinhas em uma viagem.

Recentemente, fui convidada a fazer parte da banca de TCC da Juliana Nascimento, aluna de turismo da UFJF e pude ler, comentar e avaliar seu trabalho de pesquisa sobre o Sisterwave. Na ocasião, também tive o privilégio de conhecer sua fundadora, Jussara Botelho, e entender a proposta desse aplicativo que hospeda mulheres viajando sozinhas em lares de mulheres anfitriãs.

As Sisters, em sua maioria, definem a Sisterwave como uma fonte inspiradora, que encoraja e empodera mulheres no turismo, seja para realizar uma viagem solo ou para buscar independência financeira se tornando uma anfitriã.  (NASCIMENTO, 2021)

Em um pouco mais de três anos de existência, o aplicativo já cadastrou centenas de mulheres em todo o país e ganhou recentemente um prêmio das Nações Unidas para startups tecnológicas por sua contribuição para o Objetivo do Desenvolvimento Sustentável (ODS) 5 – Igualdade de Gênero. A intenção é que ele cresça agora também como fórum para troca de experiências, informações e dicas de viagem.

Esse foi o caminho do guia para mulheres viajantes criado em uma parceria do Booking.com com a ONG feminista Think Olga. São pequenos apoios para contribuir para que elas se sintam mais confiantes e seguras.

Na pesquisa de Juliana, foram recorrentes os depoimentos sobre constrangimentos por interpretações maliciosas de terceiros – “o que uma mulher viajando sozinha pode estar querendo em um bar ou restaurante?” – ou de que deixaram de fazer passeios específicos (sobretudo noturnos) por medo de violência.

Infelizmente esse receio tem amparo nas estatísticas brasileiras de violência contra mulher e, por isso, nesse mês da mulher vale lembrar o que queremos: respeito e liberdade!

Por: Mariana Madureira

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